top of page

Soft skill ou Competência estratégica?

“Penso, logo existo.”

René Descartes


Até quando continuaremos vivendo em uma sociedade guiada quase exclusivamente pela razão, pelas técnicas, pelo objetivismo, pelo pragmatismo e, mais recentemente, pela inteligência artificial? Especialmente no campo profissional, parece haver pouco espaço para o mundo emocional, o subjetivo, a sensibilidade e outras habilidades associadas ao lado direito do cérebro.


A ciência há muito já demonstrou que os dois hemisférios cerebrais atuam de forma integrada e complementar — e não de maneira isolada, como tantas vezes se observa nas práticas sociais, educacionais e profissionais.


As chamadas habilidades emocionais — as soft skills — são historicamente desvalorizadas. Uma análise atenta dos registros históricos revela dados e acontecimentos que sustentam essa percepção. Vamos revê-las:


Na Grécia Antiga (século V a.C. – século IV a.C.), a razão se torna sinônimo de controle e sabedoria, enquanto as emoções passam a ser vistas como fontes de erro e desordem, através de pensamentos de filósofos como:


  • Platão (427–347 a.C.), que fundou a Teoria das Ideias: o mundo sensível (o que vemos) é imperfeito e ilusório; o mundo verdadeiro é o mundo das ideias, eterno e imutável.


  • Aristóteles (384–322 a.C.), que fundou a Lógica Formal, onde pensar corretamente era essencial para conhecer o mundo.


Na Idade Média (século V – século XV), o cristianismo dominou o pensamento europeu, trazendo uma visão dualista e acrescentando uma leitura moral aos valores da época: emoções como ira, luxúria e inveja estavam ligadas ao pecado e à carne; a fé racional e o autocontrole espiritual eram exaltados, pois as emoções traziam a desordem que afasta de Deus. O ideal cristão valorizava o autocontrole e a fé racional.


No Renascimento (séculos XIV–XVI), houve um retorno à razão clássica existente na Grécia e Roma. O Iluminismo do século XVIII foi o ápice da apologia à razão: “Penso, logo existo”, de Descartes, onde o homem racional era visto como o ápice da evolução humana. A ciência moderna surge como fruto direto dessa valorização do racional e do controle da natureza. É muito recente ainda, se pensarmos na cronologia da história, observarmos esse retorno à valorização emocional.


Na era Moderna e Contemporânea, no século XIX, tivemos movimentos como o Romantismo, que reagiram à frieza racionalista, exaltando a emoção, o subjetivo e o instinto. Outro ponto relevante nessa cronologia foi Freud e a psicanálise, que introduziram a ideia de que emoções reprimidas (o inconsciente) moldam profundamente o comportamento.


Mais recentemente, do século XX em diante, a psicologia, a neurociência e a educação emocional resgatam o valor das emoções como formas de inteligência.


Mas, querido leitor, se pararmos para pensar, é ainda muito recente que essa conexão emocional tenha um espaço maior na existência humana — mesmo sendo algo inerente à nossa natureza.


Vivemos séculos e séculos “amputados”. Digo isso pois, quando negamos partes de nós mesmos, acabamos vivendo pela metade ou experimentando uma potência menor de nós mesmos e do nosso existir na vida.


Viver sem acessar o mundo emocional é abdicar de parte de nossa potência. O mundo emocional é um solo rico e fértil, capaz de nos trazer pistas valiosas sobre que pessoas, lugares e experiências nos fazem bem ou não. Do que nos respeita e nos desrespeita. Do que gostamos e não gostamos.

Quando vivemos uma vida desconectados de nossas emoções, estamos automaticamente desconectados dos nossos sinais. Com isso, somos os primeiros a nos desrespeitar e, muitas vezes, ultrapassamos limites, devido à inconsciência em notar e avaliar os nossos próprios porquês e como: por que nos sentimos afrontados diante da situação “X”? Por que o tom de voz do seu chefe te causa raiva? Como lidar com a raiva? Como você sente a exaustão? Ela tem espaço?


Numa tentativa inocente de fugir das emoções, passamos a culpabilizar os outros e vamos nos tornando aquém de nós mesmos, nos desconhecendo em essência. “Precisamos colocar limite em fulano”, mas nunca sustentamos o limite que colocamos para nós mesmos! Paramos quando o corpo e a mente cansada nos pedem para parar? Damos à vida a presença que ela nos pede?


O mais interessante é que sabemos levantar as mãos para apontar culpados, terceirizando as responsabilidades de nossas escolhas e de como guiamos nossa vida. Acredito, piamente, que esse movimento também é essencial, pois muitos dos limites sociais foram ultrapassados, e os “bastas” vêm dando voz, colocando holofote onde é necessário.

Então digo: que bom que esse movimento acontece! Mas, como dizia nosso amigo Jung, precisamos prestar atenção ao fato de que, quando um padrão sai de um extremo, naturalmente ele vai para o outro extremo, até conseguir chegar ao equilíbrio dessa energia e descobrirmos o caminho do meio.


Mas será que essa desconexão do “fora” também não existe dentro? E, talvez, o “fora” seja apenas uma consequência do “dentro”?


Vivemos eras e eras valorizando o pensar, o fazer, o pragmatismo, a razão e as hard skills. Falamos de inteligência emocional, um dos braços das soft skills, mas será que são fontes distintas e não complementares?


A polarização já aconteceu, e socialmente vivemos uma luta pela humanização, empatia, respeito, inclusão, entre outros valores. Meu ponto aqui é que não estamos para tomar partido, mas sim para incluir, somar e agregar.


Veja bem: uma mente focada na razão, que não percebe o que o corpo sente e apenas segue, sem cuidar desses sinais, resulta em um corpo doente — algo que estamos vendo de forma contundente na sociedade e no mundo corporativo. Como inclusive falei recentemente em dois artigos: vivemos uma era de doenças, crise na saúde mental e emocional nunca antes vista, afastamentos do trabalho, exaustão, ansiedade... Enfim, algo sem precedentes na história. Seguem os artigos, caso queiram se aprofundar no tema:



Agora, no polo extremo, emoção sem contorno, sem compreensão cognitiva, sem elaboração, é uma bomba ambulante desgovernada, que mantém na dor quem a sente e quem convive.


Se pararmos para pensar, a polarização não é algo que vem acontecendo apenas no mundo corporativo, na razão ou na emoção, não é mesmo? O mundo anda polarizado, em guerra, em lutas — e isso não é sustentável a médio prazo. Na verdade, já não é sustentável.


Por este motivo, se você é um líder que possui grandes hard skills, mas lhe faltam soft skills, busque ajuda, treine, mergulhe nesse território. Tenho certeza de que isso te fará um profissional melhor, mais completo e preparado para o mercado de trabalho. A médio e longo prazo, você também pode adoecer vivendo uma polarização interna.


Agora, se você é um líder super hábil em soft skills e deseja crescer na carreira, busque todas as técnicas necessárias para o seu crescimento. Ambos os caminhos são essenciais e fundamentais.


Vivemos em um mundo que precisa de antídotos para todas essas dores. Se a dor é causada pela separação, amputação de partes nossas, exclusão de pessoas que pensam diferente de nós, definitivamente, a cura é o oposto disso. Pense nisso!


Por último, pense onde você está e onde deseja chegar. Só você pode construir uma experiência diferente para si e para aqueles ao seu redor, seja através de hard e/ou soft skills.


Até a próxima.


Um abraço,

Joana Madia.

 
 
 

Comments


bottom of page